COMO SER DONO DE UM OUTBACK? EMPRESA NãO USA FRANQUIA, E 85% DOS SóCIOS SãO EX-FUNCIONáRIOS

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O Outback tem franquia? Quanto custa comprar uma unidade e ser dono do negócio? Você já deve ter percebido que as unidades têm os nomes dos sócios nas fachadas. E isso não acontece ao mero acaso: tem total vínculo com o modelo de negócio que a marca utiliza no Brasil - e no mundo também.

Para crescer, é muito comum que empresas adotem o sistema de franquia para expandir a capilaridade. Desta forma, os custos são diluídos entre franqueado - quem compra uma unidade, tendo direito a uso de marca e transferência de know how - e franqueador - dono da rede. Essa relação é regida pela lei n° 13.966/2019, específica para o setor.

Porém, a famosa rede de restaurantes, originada nos Estados Unidos, mas com características que remetem à cultura da Austrália, não se utiliza desse modelo. Com uma média de custo de instalação de operação girando em torno de R$ 5 milhões por unidade, o Outback optou por uma estrutura voltada para sociedade com minoritários. Segundo a empresa, 85% deles são ex-funcionários. O Outback não revela investimento inicial, mas analistas estimam em R$ 60 mil a R$ 100 mil.

Há duas principais diferenças em relação ao que a marca faz e o sistema de franquias. A primeira delas é que essa sociedade não precisa atender às exigências da lei de franquias, por não ser uma. A segunda é o controle.

O Outback tem maior controle nas unidades por não utilizar franquia?

A tendência é que sim, conforme explica o consultor do Sebrae-SP Adelmo Solera. Quando uma franquia é vendida, o franqueado adquire uma unidade e faz todos os pagamentos referentes ao investimento inicial, como taxa de franquia, custos de instalação e capital de giro.

Seguindo as diretrizes previstas em contrato, ele vai administrar aquela determinada unidade - sendo dono do negócio dentro do prazo do contrato. Nos EUA, por exemplo, é muito comum o franqueado ser chamado de “dono de franquia” - franchise owner.

Ambos os modelos - sócio e franqueado - têm dispositivos legais, previstos em contratos, que protegem as partes. Seja em caso de desentendimento e possível rompimento do acordo, seja para dúvidas referentes à estrutura do dia a dia.

No caso da sociedade, porém, o minoritário participa da administração, em vez de ser o único dono. Logo, o controle do majoritário tende a ser maior. “A marca tem mais domínio porque também é dona daquela unidade. O CNPJ não é apenas do franqueado”, contextualiza Solera.

Dentro da dinâmica do Outback, essa participação por parte do sócio-proprietário - que pode também ser chamado de sócio-operador - sempre será minoritária. A atuação majoritária fica a cargo da Bloomin’ Brands, também dos EUA, holding que comanda a operação.

“Os colaboradores selecionados têm a oportunidade de se tornarem minoritários do restaurante, compartilhando riscos, responsabilidades e decisões de forma conjunta. Isso significa que, embora tenham autonomia para gerir o dia a dia da operação, assim como em qualquer sociedade, os minoritários estão sujeitos a algumas regras acordadas com o acionista majoritário”, explicou a marca, por meio de nota ao Estadão.

Como ter um Outback?

Aqui entra uma peculiaridade relevante sobre a marca: para sócio-proprietário, existe uma clara preferência por pessoas que venham de dentro da estrutura interna dos restaurantes - 85% desses operadores trabalharam inicialmente como atendentes ou cozinheiros no Outback.

“Tornar-se um líder dentro da organização requer um profundo envolvimento e comprometimento com o negócio, bem como a demonstração de atitude positiva alinhada aos valores e princípios da companhia. Para aqueles que aspiram ver seus nomes na porta de um restaurante e fazer dele seu próprio espaço, oferecemos uma trilha de aprendizado e treinamento específica que dura cerca de um ano”, informa a empresa.

Porém, trabalhar no Outback não é o único caminho. O candidato a ser sócio-proprietário pode se inscrever por meio deste link.

Quanto custa um restaurante do Outback?

A partir deste ponto, é possível citar uma terceira diferença em relação ao universo de franquias: uma dificuldade maior em conseguir as informações completas.

Empresas que utilizam o modelo de franquias costumam ceder boa parte das informações referentes a investimentos e estimativas de faturamento e lucro.

A própria lei do setor faz com que tudo seja mais transparente. A Circular de Oferta de Franquias (COF), por exemplo, precisa ser entregue com, ao menos, 10 dias de antecedência a qualquer assinatura de contrato ou pré-contrato. No documento, constam informações essenciais como “total estimado do investimento inicial, valor da taxa inicial de filiação ou taxa de franquia, valor estimado das instalações, dos equipamentos e do estoque inicial e suas condições de pagamento”, entre outros pontos.

No caso do Outback, os valores de investimento inicial, expectativas de faturamento, lucro e tempo de retorno - payback - não foram passados para a reportagem. Eles apenas informam que é proporcional à participação do minoritário no negócio.

O Outback informou que esse sócio-proprietário tem direito a pró-labore, que é o salário de um empreendedor, e dividendos.

Especialistas de mercado consultados pelo Estadão estimam que o investimento inicial para ser sócio-proprietário seja de R$ 60 mil a R$ 100 mil.

A reportagem também solicitou como funciona este processo de treinamento de funcionários para virarem sócios minoritários, mas a empresa não respondeu.

Estratégia do Outback

De acordo com o vice-presidente de consultoria do Grupo 300 Ecossistema de Alto Impacto, Lucien Newton, essa falta de acesso à informação completa antes de participar do processo seletivo pode ser uma estratégia da marca.

“O Outback usa um pouco do gatilho da escassez (quando faz crer que há poucas unidades disponíveis para o negócio). Então, precisa passar por um processo (de um ano, conforme a marca) que tende a ser minimamente difícil para, no final das contas, ser como se fosse uma entrevista de emprego para cargos de alta chefia”, comenta.

Newton complementa que a preferência por ex-funcionários pode estar ligada ao fato de serem pessoas que já estão acostumadas a seguirem os processos internos da marca. “Acabam sendo pessoas muito mais de processos do que de gestão.”

Ainda segundo Newton, é possível interpretar essa atuação da rede como uma alternativa a altos encargos trabalhistas de um gerente-geral sob a égide da CLT, por exemplo.

Além de poder ser visto como uma espécie de “plano de carreira”, com um certo incentivo a colaboradores, já que “qualquer um” tem a possibilidade de pleitear ser dono de uma unidade.

“O modelo deles dá uma boa afagada no ego também. Coloca o nome na porta, mostra que conseguiu adquirir uma unidade”, diz.

O gap financeiro para adquirir um Outback

Refletindo sobre como um funcionário com salário inicial mais baixo, sem posição de chefia, por exemplo, pode chegar à possibilidade de adquirir parte do negócio, Newton complementa que, após um certo período, com um crescimento dentro da estrutura do restaurante, é viável que o funcionário alcance cargos de chefia intermediária e, após uma demissão, com acréscimo da multa de 40% sobre o FGTS, consiga angariar os recursos financeiros necessários para entrar na sociedade.

Por fim, ele ressalta que isso só é possível ser feito em um negócio consolidado no mercado. “Existem muitas pequenas empresas que tentam este tipo de processo, mas que acaba virando bagunça. Conseguir escalar neste tamanho em uma rede como o Outback demonstra uma segurança relevante no negócio.”

Presente no território nacional desde 1997, a rede atualmente conta com 158 unidades no País, sendo que o sócio-proprietário está presente em todas as operações - em 21 Estados, além do Distrito Federal.

A Bloomin’ Brands, holding do Outback, tem capital aberto na Nasdaq - bolsa de valores dos EUA - e também é dona das marcas Abbraccio e AussieGrill, com mais de 12 mil colaboradores no Brasil.

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